sábado, 24 de novembro de 2007

LIBERDADE

Cada um encontrará seguramente muitas verdades acerca do mau funcionamento da esfera política em Portugal. Para mim a incapacidade estrutural de criarmos em Portugal condições para o desenvolvimento é um problema histórico que teve o seu epílogo no salazarismo.

Uma espécie de ideário Nacional Socialista prevaleceu sobre toda a nossa história, desde que um bandido se voltou contra a mãe, assumindo este quintal como seu, passando pelo criação do mito ultramarino nas suas várias etapas históricas: Índia, Brasil e África, até ao final do Salazarismo.

Quando finalmente quase sem mitos (nos ecrans do imaginário português ainda se projecta difuso, ténue o mito europeu) nos encontramos connosco, porque a história é inexorável, constatamos que andámos um milénio subjugados a supostos arquétipos que não existem. Fora deste pequeno rectângulo não há mais nenhumas riquezas para explorar para os intrépidos navegadores portugueses do séc. XXI.

O D. Sebastião não existe, eventualmente nunca existiu e não aterrará em Portela nenhuma. Salazar teve uma miserável existência que ainda hoje explica elementos perversos da mentalidade tipo Nacional. Ele atravessa este mito do Sebastianismo e, mesmo depois de morto e enterrado, conspurca-o, soterra um mito romântico, com um rosto híbrido mas bonito, na hedionda massa sangrenta dos crimes cometidos pelo regime em Portugal e em África, silencia-o na matriz do obscurantismo, da censura, das perseguições por motivos religiosos. Eu preferia muito sinceramente esse Sebastião que não inventou a Pide, que não criou aos seu peitos um Cardeal Cerejeira, que não foi responsável por um autêntico genocídio em África. Preferia esse Sebastião que provavelmente deu a vida por um ideal mesmo se esse ideal não fosse meu.

Assistimos recentemente à tentativa de recuperar a imagem de Salazar. Isso faz parte do circo mediático a que estamos expostos. Também assistimos diariamente a guerras em directo, à fome aos crimes mais violentos. Tudo isso apenas serve para nos isolar porque isolados assimilamos muito mais facilmente tudo aquilo que os produtores de objectos políticos nos querem impingir. Isolados, encerrados na nossa esfera individual, despertam em nós desejos animais de consumir mais e mais quase sem limite. Na Alegoria da Caverna Global somos apenas sombras e os rostos dos nossos Demiurgos ostentam máscaras com rótulos perfeitos ao nível do design com conteúdos cromáticos cuja fruição nos dá a ilusão da felicidade.

No meio desta porcaria toda para nós, para mim seguramente, Salazar está enterrado e bem enterrado na casinha dos horrores cujas paredes caiadas ostentam um bolor fatal e o cheirinho a alecrim serve apenas para disfarçar o cheiro dos corpos putrefactos das suas vítimas.

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